Arte e Cultura

Rita Lee – Uma Biografia: a vida da Rainha do Rock em páginas paulistanas

Autor: Rita Lee
Ano de lançamento: 2016
Editora: Globo Livros

“Rita Lee – Uma Biografia” é o primeiro mergulho autobiográfico da eterna rainha do rock brasileiro, lançado em 2016 pela Globo Livros. Escrito pela própria Rita Lee, o livro é um strip-tease emocional que passeia por sua vida com a irreverência e o humor ácido que marcaram sua carreira. Não é apenas um relato cronológico, mas uma colcha de retalhos de memórias, onde a cantora revisita desde a infância na Vila Mariana até os palcos lotados, passando por prisões, amores e overdoses. É um texto que pulsa com a energia de quem viveu sem freios, entregando ao leitor um retrato cru e colorido de uma das maiores artistas do Brasil.

O tema central da obra é a autenticidade sem filtros. Rita desnuda sua trajetória com uma coragem que desafia convenções, falando abertamente sobre abusos sofridos na infância, o uso de drogas e a relação intensa com Roberto de Carvalho, seu parceiro de vida e música. Mais do que uma biografia de rockstar, é uma celebração da liberdade individual e da resiliência, com reflexões que misturam sarcasmo e ternura. O livro se propõe a desmistificar a persona pública de Rita, mostrando que por trás da “ovelha negra” havia uma mulher complexa, vulnerável e absurdamente divertida.

Rita começa com a infância em São Paulo, marcada por uma família de classe média e um estupro aos seis anos que ela só enfrentou na terapia décadas depois. Passa pela explosão com Os Mutantes na Tropicália, a expulsão do grupo, os anos de Tutti Frutti e o sucesso solo com hits como “Lança Perfume”. O encontro com Roberto, os filhos, as internações e a aposentadoria dos palcos em 2012 também ganham espaço, tudo narrado em capítulos curtos que parecem conversas de bar. É uma vida que não cabe em linhas retas, e Rita não tenta forçar isso.

Após se aposentar dos shows, ela decidiu organizar suas memórias num momento em que o rock nacional já era nostalgia para muitos, mas seu legado seguia vivo. A obra chega num cenário pós-redemocratização, com o país ainda lidando com as cicatrizes da ditadura – um período que Rita viveu intensamente, inclusive sendo presa em 1976 por porte de maconha enquanto grávida. É também um eco da São Paulo dos anos 60 e 70, quando a cidade era o berço da contracultura e da Tropicália, movimentos que Rita ajudou a moldar.

Rita Lee, a autora, dispensa apresentações, mas vale o registro: nascida em 31 de dezembro de 1947, na capital paulista, ela foi a caçula de três irmãs numa família de descendentes americanos e italianos. Começou na música aos 15 anos como baterista, fundou Os Mutantes com Arnaldo e Sérgio Baptista em 1966 e virou ícone do rock com mais de 55 milhões de discos vendidos. Multi-instrumentista, compositora, atriz e ativista pelos animais, Rita escreveu o livro sozinha, escolhendo fotos e criando a capa, com apoio do jornalista Guilherme Samora, que aparece como um “fantasminha” corrigindo datas e detalhes. Faleceu em maio de 2023, aos 75 anos, deixando um legado imortal.

“Rita Lee – Uma Biografia” vendeu mais de 200 mil exemplares em quatro meses, liderando as listas de não-ficção no Brasil. Em 2017, foi lançado em Portugal e ganhou o prêmio de Melhor Biografia pela Associação Paulista de Críticos de Artes (APCA) em 2016. Com 296 páginas, o livro foi um sucesso instantâneo, esgotando edições e rendendo à Globo Livros um retorno digno de hit parade. A obra também inspirou debates e releituras da carreira de Rita, consolidando-a como uma das vozes mais influentes da música e da literatura brasileira.

São Paulo é o palco principal dessa história. Rita relembra a Vila Mariana dos anos 50, com suas ruas tranquilas e o colégio tradicional onde estudou, o Des Oiseaux. Cita o Teatro Aquarius, no Bixiga, onde gravou com Elis Regina, e os rolês juvenis no Parque Trianon, na Avenida Paulista. A cidade aparece como um organismo vivo: o centro caótico dos anos 70, os bares da Pompéia onde o Ira! nasceu (ela foi madrinha da banda), e até o sítio em Cotia, na Grande São Paulo, onde viveu seus últimos anos. É um mapa afetivo de uma paulistana que transformou o concreto em poesia.

Rita conta que usou um colar de pedras de LSD ao desembarcar em São Paulo, uma ousadia que resume sua relação com as drogas – tema que ela nunca escondeu. O livro quase teve trechos censurados por advogados da família, mas Rita insistiu na versão sem cortes, prometendo uma “versão proibidona” que nunca saiu. O apelido “Ritinha” veio da infância, e o cabelo vermelho, marca registrada, foi aposentado em 2014. E tem mais: o sucesso do audiobook, narrado por Mel Lisboa e Guilherme Samora, levou fãs a pedirem uma adaptação pra cinema – quem sabe um dia? É Rita sendo Rita, sem pudores e com um sorriso maroto.