A banda Ira!, ícone do Rock brasileiro dos anos 80, volta a ser alvo de controvérsias devido à letra de sua canção “Pobre Paulista”, presente no álbum *Vivendo e Não Aprendendo* (1986). A música, composta por Edgard Scandurra, tem gerado debates acalorados nas redes sociais, com fãs e críticos apontando supostos traços de xenofobia em seus versos. A terceira estrofe, em particular, desperta indignação: “Não quero ver mais essa gente feia / Não quero ver mais os ignorantes / Eu quero ver gente da minha terra / Eu quero ver gente do meu sangue”. Para muitos, essas palavras refletem preconceito contra imigrantes, especialmente nordestinos, que historicamente enfrentam discriminação em São Paulo.
A discussão ganhou força após uma entrevista de Scandurra no podcast Fala VJ, onde o guitarrista abordou abertamente o contexto da composição. Ele declarou: “‘Pobre Paulista’ foi o maior equívoco que eu cometi na minha vida. Eu acho que eu quis ser mais punk do que eu podia ser realmente. Eu tinha uma noção do punk assim, ‘o punk é feito para chocar as pessoas’. E a gente estava numa ditadura, então, eu era tão ingênuo, que eu usei para falar dos meus professores da escola, para falar dos meus pais, eu usei uma metáfora que atingia muito mais gente além desse meu mundinho estudantil”. Scandurra admitiu que, aos 16 ou 17 anos, não tinha plena consciência do impacto de suas palavras, mencionando o que hoje chama de “racismo estrutural” presente em sua mentalidade na época.
A reação do público foi intensa. Em Fortaleza, durante um show em 1996, a banda foi vaiada ao tocar a canção, conforme relatado por Maurício Gaia, apresentador e produtor cultural. Ele descreveu o momento: “ao término da música, o vocalista Nasi xingava o público de volta, enquanto Edgard tentava esfriar os ânimos e esclarecer que havia uma mal-entendido ali”. Desde o início dos anos 90, o Ira! optou por não incluir “Pobre Paulista” em seu repertório, exceto pelo refrão em algumas ocasiões, como forma de evitar polêmicas. Scandurra reforçou essa decisão: “A gente faz só o refrão, ‘Parou, pensou e chegou a essa conclusão’. Obrigado e tchau. Nunca mais tocamos”.
O vocalista Nasi também já expressou seu desconforto com a música. Em uma entrevista à revista Trip em 2009, ele revelou um episódio marcante: “Eu estava com minha ex-namorada e um casal de amigos em um bar, e o Edgard chegou quando meu amigo estava falando sobre ‘Pobre Paulista’. E ele sentou e disse: ‘Olha, essa música é realmente um preconceito contra a invasão de nordestinos, era o que eu estava pensando na época e foi isso o que eu quis dizer mesmo, eu não agüentava essa coisa de música baiana, de Caetano, de Gil’”. Nasi afirmou que, após essa conversa, decidiu nunca mais cantar a música, sentindo-se traído por ter defendido a canção por anos sob a interpretação de rebeldia juvenil. Apesar das explicações e do afastamento da música, a polêmica persiste, reacendendo debates sobre responsabilidade artística e o impacto de letras no contexto social.
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