Grande São Paulo

Luminárias orientais são removidas no bairro Liberdade

Na semana do Dia da Consciência Negra, em 20 de novembro de 2024, a Rua dos Aflitos, no coração do bairro da Liberdade, em São Paulo, passou por uma transformação simbólica. As tradicionais luminárias japonesas, conhecidas como lanternas Suzuranto, foram retiradas e substituídas por modernas luzes de LED. A mudança, realizada em 18 de novembro, atendeu a uma demanda antiga de ativistas do movimento negro, que viam nos postes asiáticos um apagamento da história local. Diferente do restante do bairro, que mantém sua estética oriental, essa rua agora reflete um esforço para destacar seu passado ligado à memória negra e indígena, centrado na Capela dos Aflitos, construída em 1779 ao redor do antigo Cemitério dos Aflitos.

 

A história da região é mais antiga que a imigração japonesa, que deu ao bairro sua identidade atual. Antes de ser chamada Praça da Liberdade, a área era conhecida como Largo da Forca, um ponto de execução de escravos fugitivos até meados do século 19. O Cemitério dos Aflitos, primeiro espaço público do tipo na cidade, abrigava corpos de negros, indígenas e outros marginalizados, como atestam as nove ossadas encontradas por arqueólogos em 2018. A pressão para remover as luminárias veio de entidades como a Associação Amigos da Capela, que, após seis anos de luta, celebrou a reurbanização do Beco dos Aflitos como parte do projeto Ruas Abertas. Para eles, a troca é uma reparação histórica, dando visibilidade a um patrimônio tombado que resistiu ao tempo e à orientalização do bairro iniciada nos anos 1970.

 

A decisão da Prefeitura de São Paulo, segundo nota oficial, buscou equilibrar as camadas culturais da Liberdade, preservando a herança japonesa em outras ruas enquanto reconhece a memória dos povos escravizados na Rua dos Aflitos. Hubber Clemente, hoteleiro e membro da associação, reforçou à TV Globo que não se trata de rivalidade entre culturas, mas de evitar o esquecimento de uma narrativa em favor de outra. Atualmente, o local passa por obras para abrigar o Memorial dos Aflitos, um projeto que ganhou força após anos de reivindicações e que promete transformar a rua em um espaço de reflexão sobre a história negra da cidade. Apesar de um incidente em novembro, quando uma parede de um prédio vizinho caiu sobre o sítio arqueológico, a iniciativa segue como um marco de resgate de um passado que São Paulo por muito tempo enterrou sob o asfalto.