Grande São Paulo

Guarulhos apura denúncias de transferência de dependentes químicos da Cracolândia

A Prefeitura de Guarulhos, na Grande São Paulo, iniciou uma investigação para verificar denúncias de que dependentes químicos da Cracolândia, localizada na região central de São Paulo, teriam sido transportados e abandonados em bairros da cidade. As acusações surgiram após o esvaziamento repentino da Rua dos Protestantes, no bairro Santa Ifigênia, ponto conhecido por concentrar cerca de 200 usuários de drogas, segundo estimativas de moradores. A situação, que ganhou destaque na última semana de maio de 2025, levanta questionamentos sobre as ações das autoridades na gestão da Cracolândia.

A denúncia mais notória foi publicada nas redes sociais pelo padre Júlio Lancellotti, coordenador da Pastoral do Povo da Rua, da Arquidiocese de São Paulo. Em sua postagem, ele compartilhou uma mensagem anônima que afirmava: “Na madrugada de sábado (10) para domingo (11), um caminhão da prefeitura de SP abandonou várias pessoas da Cracolândia no bairro Santos Dumont, em Guarulhos”. A prefeitura de Guarulhos, em nota, informou que “recebeu com preocupação e cautela” as denúncias e mobilizou as secretarias de Segurança Pública, com apoio da Guarda Civil Metropolitana (GCM), e de Desenvolvimento e Assistência Social para apurar os fatos e tomar medidas cabíveis, caso as acusações sejam confirmadas.

O prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes, negou veementemente qualquer envolvimento da administração municipal no suposto transporte de dependentes químicos. Em entrevista à imprensa na sexta-feira, 16 de maio de 2025, Nunes classificou a denúncia como “descabida, uma coisa totalmente infundada, absurda” e criticou a atitude do padre Lancellotti, afirmando que a informação partiu de “um ato irresponsável” ao publicar uma mensagem de origem desconhecida. Ele acrescentou que pretende conversar com o prefeito de Guarulhos, Lucas Sanches, para esclarecer a situação, sugerindo que pode ter havido um “erro de comunicação”.

A dispersão dos usuários da Cracolândia não é um fenômeno isolado. Desde o dia 10 de maio, a Rua dos Protestantes, que abrigava o principal “fluxo” de dependentes químicos, ficou praticamente vazia. Moradores e movimentos sociais, como o A Craco Resiste, relatam que os usuários se deslocaram para outros pontos do centro de São Paulo, como o Minhocão, Santa Cecília e a região do Mercado Municipal. A Secretaria de Segurança Pública (SSP) atribui o esvaziamento a ações policiais, incluindo prisões de traficantes, apreensões de drogas e fechamento de estabelecimentos usados para lavagem de dinheiro. Em 2024, a SSP registrou quedas de 43,9% em roubos e 28,8% em furtos na região central, creditando os resultados ao reforço no policiamento.

A situação expõe a complexidade do problema da Cracolândia, que envolve não apenas dependência química, mas também vulnerabilidade social e criminalidade. Relatos anteriores, como uma denúncia de abril de 2025 no bairro Vila Rio, em Guarulhos, indicam que veículos teriam abandonado pessoas em situação de vulnerabilidade, sugerindo um padrão que agora é investigado. O vice-prefeito de São Paulo, Mello Araújo, informou ao Estadão que ações recentes retiraram 122 usuários da Rua dos Protestantes, com 80 removidos na segunda-feira e 42 na terça-feira, mas não esclareceu o destino dessas pessoas.

Organizações de assistência social e profissionais de saúde expressam preocupação com a interrupção de tratamentos e a dificuldade de localizar pacientes que estavam em acompanhamento. O movimento A Craco Resiste denunciou ações da GCM, incluindo uso de spray de pimenta e revistas vexatórias, como fatores que contribuem para a dispersão dos usuários. Enquanto Guarulhos segue com as investigações, o debate sobre a Cracolândia permanece centrado na necessidade de políticas públicas que combinem segurança, assistência social e saúde, evitando soluções que apenas desloquem o problema para outras regiões.